Análise da música de “EU TE BUSCO”
Esta é uma versão da música “In the secret”, de Andy Park. Para ser justo, não encontrei maiores dificuldades em sua forma original. A sua versão em português é que está corrompida. Os dois aspectos da versão em português que me aterei nesta análise não estão comprometendo a música em sua forma original: 1. In the stillness, You are there, teve sua versão em português: no silêncio tu estás. Uma tradução literal seria: “na quietude, tu estás”. Creio que Andy Park estava pensando em Mateus 6.6 quando escreveu essa frase em inglês. Mas a versão em português, combinada com outras frases comprometeu a letra, conforme análise abaixo. 2. I am reaching for the highest goal, That I might receive the prize, pode ser traduzido livremente: “Estou comprometido (prossigo) em alcançar o alvo maior, onde receberei o prêmio”. No entanto a versão em português compromete isto ao afirmar que eu estou lutando para conquistar (e não receber) a coroa.
Dito isto, comecemos a análise destacando um ponto positivo. O tema da busca pelo Senhor é bíblico e se encaixa perfeitamente com a exortação de que todo crente deve procurar viver constantemente em santidade: Filipenses 2:12 – Assim, pois, amados meus, como sempre obedecestes, não só na minha presença, porém, muito mais agora, na minha ausência, desenvolvei a vossa salvação com temor e tremor. Esse desenvolvimento da salvação a que Paulo se refere é a santificação. Uma vez salvo, o crente deve se envolver na batalha da fé subjugando suas vontades e desejos a quem o salvou, despindo-se do velho homem e olhando firmemente para o autor e consumador da fé (Hb. 12:12). Não há como buscar santificação sem se lançar ao conhecimento de Deus. Passemos agora a considerações problemáticas:
I. DEUS ESTÁ EM SILÊNCIO?
A frase “no silêncio tu estás”, poderia tentar expressar uma dessas duas realidades:
· Um sentimento do autor em relação a Deus. Há salmos em que o autor se refere a Deus assim: Salmo 35:23 – Acorda e desperta para me fazeres justiça, para a minha causa, Deus meu e Senhor meu. Lógico que o salmista sabia que o Senhor não dorme e nem está distraído. Mas essa era a sua forma de clamar ao Senhor por socorro. Esse era seu sentimento em relação à ação divina que parecia tardia. No entanto, ele termina o salmo com expressões de louvor a Deus, porque sua vida não está ao sabor de sentimentos, mas de convicções sobre o caráter do seu Deus.
· Um desejo de estar sozinho e em solidão para buscar a Deus. Há muitos ruídos ao nosso redor (inclusive em nosso coração) que tendem a atrapalhar nossa comunhão com Deus. Por vezes tenho que dizer ao meu coração: “Volta, minha alma, ao teu sossego” (Salmo 116.7a). Ou como Jeremias: Lamentações 3:26 – Bom é aguardar a salvação do SENHOR, e isso, em silêncio. Isto é um desafio para nós, principalmente nestes dias de inquietude e ansiedade.
No entanto, observemos essa frase à luz de seu contexto (combinada com outros termos):
Deus está no silêncio tão profundo que é preciso clamar para ele se revele aos seus servos? Ou no silêncio tão intenso que não se ouve mais a sua voz? Bom, alguns podem achar que estou sendo radical aqui, mas é preciso de fato ir à raiz da teologia bíblica e perceber que há erros graves.
1. Mesmo após a queda do homem, o Senhor não permaneceu em silêncio. Pelo contrário, foi em busca do homem e lhe fez conhecer o que podemos chamar de “proto-evangelho”: Genesis 3:15 – Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar.
2. Toda a criação testemunha que Deus não está no silêncio. Salmo 19:1 – Os céus proclamam a glória de Deus, e o firmamento anuncia as obras das suas mãos. Paulo usa da criação para destacar que Deus não está no silêncio: Atos 17:26-27 – de um só fez toda a raça humana para habitar sobre toda a face da terra, havendo fixado os tempos previamente estabelecidos e os limites da sua habitação; 27 para buscarem a Deus se, porventura, tateando, o possam achar, bem que não está longe de cada um de nós. Deus sempre esteve se revelando à humanidade, mesmo que por meio de sua “revelação geral”.
3. Jesus Cristo é a revelação do Pai. Moisés, que chegou tão perto, jamais viu a Deus: Êxodo 33:20 – E acrescentou: Não me poderás ver a face, porquanto homem nenhum verá a minha face e viverá. O evangelista João é categórico: João 6:46 – Não que alguém tenha visto o Pai, salvo aquele que vem de Deus; este o tem visto. Mas há uma revelação maravilhosa do Pai: Jesus: João 1:18 – Ninguém jamais viu a Deus; o Deus unigênito, que está no seio do Pai, é quem o revelou. Jesus é a “exegese” exata do Pai. Como podemos dizer : “tua face eu quero ver” diante de versículos tão claros como estes? Ou ainda pedir para ele se revelar a mim, uma vez que Cristo é esta revelação do Pai?
Se ainda não está claro, observe Hebreus 1:1-3 – Havendo Deus, outrora, falado, muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, 2 nestes últimos dias, nos falou pelo Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas, pelo qual também fez o universo. Neste versículo há uma síntese do que já afirmamos acerca do “silêncio” de Deus: Ele FALOU muitas vezes, de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas e agora pelo Filho! Nosso Deus está longe de estar no silêncio.
4. As Escrituras compreendem a revelação máxima de Deus. 2 Timóteo 3:16 – Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça. A Bíblia foi soprada da parte de Deus como sua suprema revelação. Ela é a nossa base de julgamento para todas as coisas, inclusive para supostas “revelações” diretas.
Não se pode cantar uma música que está em contradição com o Deus que fala e se releva constantemente, conforme alguns dos textos que vimos. Mas há outro erro grasso na música:
2. A COROA CONQUISTAR?
Prosseguindo para o alvo eu vou
A coroa conquistar
Vou lutando, nada pode me impedir, eu vou Te seguir
O autor da letra original (em inglês) deveria estar pensando em Filipenses 3:12b e 14 para compor o primeiro verso dessa estrofe, principalmente o v.14 – mas prossigo para conquistar aquilo para o que também fui conquistado por Cristo Jesus. 14 prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus. Mas o autor da versão em português se desviou do sentido bíblico. Paulo não está falando de uma conquista que ele obterá por seu esforço. Ele está falando de objetividade de vida. A ênfase não está na conquista, mas em se prosseguir para o alvo, em contraste com os que se atém à vida deste mundo, conforme o contexto: Filipenses 3:19 – O destino deles é a perdição, o deus deles é o ventre, e a glória deles está na sua infâmia, visto que só se preocupam com as coisas terrenas. Paulo está prosseguindo para, no fim, conquistar aquilo que foi dado a ele por meio de Cristo: o prêmio.
Entretanto, o problema maior está na “conquista da coroa”. Da maneira como essa estrofe foi composta, Paulo está prosseguindo para conquistar a coroa. Alguém que tem conhecimento das Escrituras pode até entender o que o autor da versão está querendo dizer, mas num mundo onde o humanismo tem renascido, onde a soberania de Deus tem sido banida e onde o arminianismo tem sido a corrente teológica dominante, chega-se facilmente à conclusão que essa conquista dependerá de meus esforços!
Quando as Escrituras mencionam uma “coroa” como sinônimo de prêmio final de salvação, fazem-na de maneira passiva, ou seja, mostrando o homem a recebendo e não a conquistando. Observe os textos abaixo, de autores diferentes:
· 2 Timóteo 4:8 – Já agora a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, reto juiz, me dará naquele Dia; e não somente a mim, mas também a todos quantos amam a sua vinda.
· Tiago 1:12 – Bem-aventurado o homem que suporta, com perseverança, a provação; porque, depois de ter sido aprovado, receberá a coroa da vida, a qual o Senhor prometeu aos que o amam.
· 1 Pedro 5:4 – Ora, logo que o Supremo Pastor se manifestar, recebereis a imarcescível coroa da glória.
Concluindo...
1. Na primeira parte da música o autor afirma que Deus está no silêncio e que ele deseja que ele se revele e diz ainda querer ouvir sua voz. Ora, como afirmamos várias vezes, Deus já tem sua voz revelada de maneira objetiva por meio da Palavra. Cantar isto é, no mínimo, um descuido teológico.
2. Talvez o autor da versão portuguesa veja no “silêncio de Deus” um desejo por uma “revelação divina direta” (extática). Infelizmente isto é muito mais comum do que se imagina. Certa ocasião, meu pai (que também é pastor) admoestou um rapaz que batia a cabeça contra a parede e gritava: “Fala comigo, Senhor! Fala comigo!”. Incomodado, chegou até aquele jovem e disse: “Meu filho, leia as Escrituras. Deus falará com você!”. Deus não está no silêncio.
3. Quanto à questão da conquista da coroa, é lógico que ela não é conquistada, mas recebida das mãos daquele que a conquistou para nós. Cabe-nos prosseguir e lutar almejando recebê-la.
Ainda vejo outras dificuldades na letra, mas creio que as que foram analisadas aqui já são suficientes para afirmar que este cântico deve ser evitado. Não há como conciliar a mensagem que está sendo pregada através dele com o texto das Escrituras. Devemos cantar músicas que expressam uma teologia clara em seu conteúdo e que estejam em estreita conexão com sã doutrina. Talvez uma nova versão em português possa corrigir os erros que foram analisados.
No temor do Senhor,